"E
aconteceu que chegando ele perto de Jericó, estava um cego assentado junto do
caminho, mendigando. E, ouvindo passar a multidão, perguntou que era aquilo. E
disseram-lhe que Jesus Nazareno passava. Então clamou, dizendo: Jesus, Filho de
Davi, tem misericórdia de mim. E os que iam passando repreendiam-no para que se
calasse; mas ele clamava ainda mais: Filho de Davi, tem misericórdia de mim!
Então Jesus, parando, mandou que lho trouxessem; e, chegando ele,
perguntou-lhe, Dizendo: Que queres que te faça? E ele disse: Senhor, que eu
veja. E Jesus lhe disse: Vê; a tua fé te salvou". Lucas 18:35-42
A pergunta de Jesus a um homem cego que por Ele
clamava e desafiava as multidões parecia um tanto quanto óbvia, muito mais para
o médico que apresenta a narrativa bíblica. Será?
A obviedade parece fazer muito sentido, quando nos
colocamos como meros leitores: é lógico que ele queria enxergar! No entanto,
não é a toa que Jesus faz essa pergunta ao cego. A resposta daquele homem faria
toda a diferença no desfecho de sua história. Primeiro, porque ele reconheceu
objetivamente sua deficiência. Não buscou desculpas ou justificativas para a
sua condição. Sabia o que tinha e sabia o que queria. Não somente isso, ao
declarar seu pedido, aquele homem que não poderia ter testemunhado nenhum dos
milagres que Jesus já havia feito (apenas ouvira falar) declara de todo o
coração sua fé em quem Jesus era (O Filho de Davi, a Raiz de Jessé, ou seja, o
herdeiro da casa de Davi que se assentaria no seu trono para sempre, o Messias)
e também cria no que Ele (Jesus) era capaz de fazer, mesmo nada tendo
testemunhado com seus olhos. Creu de todo o seu coração.
Mas o que mais me chama atenção é a pergunta de
Jesus: Que queres que eu te faça? Logicamente Jesus sabia das necessidades
daquele homem e do quanto sua deficiência o impedia de viver uma vida plena,
ainda mais porque sua enfermidade o excluía da sociedade, por ser considerado
impuro. O cego também sabia disso. Jesus conhece muito bem nossas necessidades,
antes mesmo de a anunciarmos. E nós, sabemos bem as nossas necessidades?
Diariamente pedimos tantas coisas a Deus, que nada
tem a ver com plenitude de vida. Pedimos dinheiro, conforto, poder, trabalho,
casamento, saúde, realização de sonhos... Se Jesus perguntasse, hoje, pra você,
o que gostaria que Ele lhe fizesse, será que a resposta seria tão óbvia quanto à
do cego em sua condição? Será que saberíamos dizer o que, de fato, necessitamos
para viver em plenitude?
"Pedis,
e não recebeis, porque pedis mal, para o gastardes em vossos deleites."
Tiago 4:3
Certamente o cego já ouvira falar da restauração
que o Messias traria, conforme as palavras do profeta do Isaías:
"Então
os olhos dos cegos serão abertos, e os ouvidos dos surdos se abrirão. Então os
coxos saltarão como cervos, e a língua dos mudos cantará; porque águas
arrebentarão no deserto e ribeiros no ermo." Isaías 35:5,6
Não havia vaidade ou egoísmo na petição do cego,
mas a vontade de ver-se cumprir em sua vida a restauração de Deus prometida ao
seu povo. Ele não apenas pediu algo a Deus, mas pediu “segundo a Sua Vontade”,
porque a conhecia.
A verdade é que não sabemos pedir. Por isso mesmo
Deus nos concedeu dons para orarmos em uma linguagem que somente nosso espírito
sabe conversar com Ele, pedindo como convém o que, de fato, precisamos, não o
que queremos.
"Certo é
que Deus não ouvirá a vaidade, nem atentará para ela o Todo-Poderoso." Jó
35:13
O que impede o homem de ser sincero em suas
orações? Não ouvir seu próprio coração, sua consciência. Não aquietar sua alma
para perceber o que de fato lhe falta e lhe angustia. O homem que não consegue
se ouvir jamais conseguirá ouvir a Deus, tamanha a inquietação de sua alma.
Há algum tempo fiz uma viagem para uma cidade
turística do Sul. Em muitas situações me apercebi mais preocupado em "registrar"
aqueles maravilhosos momentos com minha família do que
"vivenciá-los". Considerei isso no meu coração e passei a me observar
melhor e a observar como a sociedade segue seu rumo.
Então passei a observar como as pessoas andavam nas
ruas e como as famílias se comportavam nos seus passeios: todos com os olhares
vidrados em celulares, tão distantes do lugar em que estavam, tão afastados das
pessoas que os acompanhavam, tão distraídos de tudo o que lhes cercava, e tive
grande rejeição por aquilo, porque me vi fazendo o mesmo. Cada vez mais temos
desprezados os relacionamentos para darmos lugar a futilidades que nos fazem
mais ansiosos e inquietos. Certamente o tempo não perdoará tamanho desperdício.
E essa vida agitada, de excesso de informação, de
excesso de conteúdo inútil e de eterna inquietude não somente nos afasta das
pessoas e do mundo em que vivemos como também nos afasta do autoconhecimento, de
quem somos e do verdadeiro propósito de nossa existência. Estamos
paulatinamente perdendo a habilidade de ouvir, de ver, de contemplar, de aquietar-se,
de sondar nossa própria consciência e coração, consequentemente de ouvir a
Deus, de conhecê-lo, de compreendê-lo e a Sua Vontade. Como saberíamos pedir
como convém?
A pergunta de Jesus ao cego tem sido a mesma
pergunta com que Deus nos aborda diariamente e não conseguimos parar para
escutar: - Que queres que eu te faça? Que queres, de fato? O que realmente você
quer?
Será que você saberia responder? Antes, será que
você tem conseguido escutar Ele lhe perguntar? Não? Então aprenda a aquietar
sua alma. Desconecte-se de tudo o que lhe distrai e não tem importância. Aprenda
a se conhecer, reconhecer suas deficiências e apresentá-las a Deus com coração
humilde, sincero e quebrantado.
A sinceridade e a fé daquele homem não trouxeram apenas cura para a sua cegueira. Trouxeram-lhe salvação.
“A tua fé te salvou!”
Leandro Dorneles
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