ELA ESCOLHEU A BOA PARTE

por Pastora Fátima Dorneles

“... Marta, Marta, estás ansiosa e perturbada com muitas coisas; entretanto poucas são necessárias, ou mesmo uma só; e Maria escolheu a boa parte, a qual não lhe será tirada.” (Lucas 10:41-42)

Somos parte de uma geração que corre incessantemente em busca de seus interesses e ideais. Frente a tal realidade a nossa vida gira em torno das nossas conquistas pessoais de modo a corrermos apressadamente de um lado para o outro em busca de um tempo melhor que se apresenta cada vez mais distante. A sensação que temos é de que quanto mais nos aproximamos da linha do horizonte, mais distante e inacessível ela se torna. Assim caminha a humanidade: a conquista de um futuro melhor é a meta de muitos. O sonho da realização pessoal persegue homens e mulheres espalhados pelos quatro cantos da terra.

Mas, infelizmente, essa busca consiste em planos terrenos, em conquistas e superação dos limites do eu, e não mais que isso. Movidos por uma crise de ansiedade e desespero, somos impulsionados a essa busca incessante de alcançar nossos ideais, porém, muitos esquecem que o futuro está logo ali, e o que será que nos aguarda?

O texto de Lucas nos leva a uma profunda reflexão sobre nossas prioridades enquanto cristãos, servos de Deus. Deparamos-nos com duas realidades bem antagônicas sobre aquilo que realmente importa para essas duas personagens, Marta e Maria. E no tempo presente, no contexto de uma vida com tantos afazeres e com tantas situações e coisas a serem priorizadas, questionamos o tempo todo o que fazer primeiro para alcançarmos os nossos objetivos, uma vez que somos parte de uma sociedade com tantas cobranças em que tudo deverá ser feito “pra ontem”. Temos a vida profissional que nos cobra agilidade, criatividade e dinamicidade; vida familiar em que filhos, esposo e administração do lar nos pressionam a desempenhar múltiplos papéis. Enquanto profissional, mulher, esposa e mãe somos cobradas por todos os lados e precisamos dar o nosso melhor, afinal, buscamos a perfeição e, ao mesmo tempo, agradar a todos e recebermos destes a aprovação e o elogio, porém, nos esquecemos de agradar a Deus e recebermos dEle a aprovação que mais importa, como bem nos ensina a parábola dos talentos:

Disse-lhe o seu senhor: Muito bem, servo bom e fiel; sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor. (Mateus 25:23)

Segundo os padrões desse mundo e da vida em si, o homem natural tem prioridades e necessidades a serem supridas. Dentre as necessidades básicas, a pirâmide de Maslow (conhecido psicólogo americano), teoria muito estudada nas ciências humanas, enumera de forma hierárquica as cinco principais necessidades do ser humano a serem priorizadas, a saber: necessidades fisiológicas (básicas), como a fome, a sede, o sono, o sexo, a excreção, o abrigo; necessidades de segurança, indo da simples necessidade de sentir-se seguro dentro de uma casa a formas mais organizadas de segurança, como, por exemplo, um emprego estável, um plano de saúde ou mesmo um seguro de vida; necessidades sociais ou de amor, afeto, afeição e sentimentos como pertencer a um grupo ou fazer parte de um clube; necessidades de estima, passando por duas vertentes: reconhecimento das nossas capacidades pessoais e reconhecimento dos outros frente à nossa capacidade de se adequar às funções que exercemos; e no topo da pirâmide, necessidades de auto-realização, em que o indivíduo procura tornar-se aquilo que ele pode ser, ou seja, “O que os humanos podem ser, eles devem ser: eles devem ser verdadeiros com a sua própria natureza”.

Maslow está afirmando que o ser humano só conseguirá se auto-realizar se todas as necessidades forem supridas, tendo como base da escala as necessidades fisiológicas e como topo desta, a auto-realização. Analogamente, o que nos chama a atenção na passagem do Evangelho de Lucas é que Marta estava preocupada e priorizando suprir suas necessidades básicas e imediatas, enquanto Maria encontrava-se num nível mais elevado, o que para Maslow seria o suprimento da última necessidade que é justamente a auto-realização. Esta, porém, não buscava apenas a auto-realização, mas sim, “ser verdadeira com sua própria natureza”, e ela sabia que sua natureza era transformada na proporção em que ouvia coisas “grandes e tremendas” de seu mestre.

Diante de tantas ocupações e tantas responsabilidades a pergunta que se faz necessário refletir é: em que posição na escala de prioridades da minha vida está o meu relacionamento com Deus? Tenho tido a postura de Maria e minhas necessidades básicas supridas ou ainda me encontro no nível das necessidades de Marta? Na qualidade de crentes em Jesus Cristo, as nossas necessidades são supridas na medida em que eu descubro “quem sou” em Deus. A Bíblia nos lembra em Lucas 12:34 que onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.

A base da pirâmide de prioridades do cristão é apresentada pelo próprio Jesus, que com toda propriedade – porque sempre ensinou o que viveu -, nos exorta que, antes mesmo das necessidades mais elementares da vida humana está a necessidade do homem em relacionar-se com Deus, sendo a eficácia da primeira uma consequência da segunda:

Mas buscai primeiro o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas (Mateus 6:33).

Entretanto, nos angustiamos de tal forma que nos sentimos impotentes por não compreender aquilo que é tão óbvio para uns e de tão difícil compreensão para outros. Andamos tão ansiosos e atribulados que mal conseguimos reservar um pouquinho do nosso “tão precioso tempo” (será mesmo?) para termos um momento com o Senhor. A oração é para muitos um ritual feito apenas na igreja, e num determinado período do culto e não uma oportunidade de intimidade e comunhão com Deus. A leitura da Palavra, - quando é feita e isso com muito sacrifício -, só mesmo nas reuniões dominicais, quando temos a disponibilidade de ir à igreja, não é verdade? Para estes o desdém e a tradição tomaram conta da intimidade e da busca pelo conhecimento de Deus.

O texto em epígrafe nos faz refletir até onde almejamos chegar e de que forma seremos capazes de alcançar aquele lugar de intimidade e comunhão com Jesus. A pergunta, no entanto, que devemos fazer é: e será que o almejamos, será que desejamos ardentemente esse lugar em Deus? E que lugar seria esse? Esse lugar em Deus, é justamente a compreensão de que somos mais que servos, somos amigos do Senhor, e isto “se” fizemos justamente o que Ele nos manda.

Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas chamei-vos amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos dei a conhecer. (João 15:15)

E, mais do que isso, somos filhos:

E, porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai. Portanto já não és mais servo, mas filho; e se és filho, és também herdeiro por Deus. (Gálatas 4:6-7)

Mas como ter intimidade com quem não conhecemos? Maria sabia que a oportunidade era ímpar e escolheu ouvir os conselhos do Mestre, conhecer um pouco mais de Jesus e aprender das coisas que duram eternamente. Em suma, ela buscou um lugar de intimidade e comunhão com o Senhor. Marta por sua vez, não se deu conta de que aquele era um momento tão precioso com o seu Deus e de que, talvez, aquela poderia ser a única oportunidade de mudar sua vida, abrir os olhos para as coisas grandiosas que Ele tinha para ensinar. Ela não compreendeu, e muitos de nós também ainda não nos demos conta que aquela era (e continua sendo) a “pérola de grande valor” e quem a encontrasse teria em suas mãos o maior tesouro que um homem pode possuir.

Outrossim, o reino dos céus é semelhante a um negociante que buscava boas pérolas; e encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo quanto tinha, e a comprou. (Mateus 13:45-46)

Mas quem está disposto a abrir mão de seus sonhos e ideais e colocar Deus “efetivamente” em primeiro lugar? Quem está disposto a pagar o preço de viver uma vida de renúncia dos seus projetos futuros (se necessário for) para adquirir a “pérola de grande valor”? Quem assim não consegue viver é porque ainda não descobriu que o que Deus projetou para o nosso futuro é infinitamente melhor do que aquilo que planejamos.

Pois eu bem sei os planos que estou projetando para vós, diz o Senhor; planos de paz, e não de mal, para vos dar um futuro e uma esperança. (Jeremias 29:11).

E o que Ele tem planejado para nós, somente aquele que decidiu alimentar seu espírito pode compreender.

Mas, como está escrito: As coisas que olhos não viram, nem ouvidos ouviram, nem penetraram o coração do homem, são as que Deus preparou para os que o amam. (1Coríntios 2:9)

Porque, assim como o céu é mais alto do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos mais altos do que os vossos pensamentos. (Isaías 55:9)

Escolher ouvir e obedecer ao Senhor Jesus é fazer a mesma escolha de Maria, é escolher a boa parte, a melhor parte; é escolher uma vida de intimidade e comunhão com aquele que tem os pensamentos mais elevados que os nossos pensamentos e isso é algo indescritível e incomparável.

Temos, hoje, a oportunidade de parar em meio à agitação do nosso cotidiano e reservarmos um tempo especial para Jesus. Temos o privilégio de viver em um país onde (ainda) há tolerância religiosa e certa liberdade (até quando não sabemos) para crer, viver e pregar a Palavra de Deus sem sermos censurados ou penalmente punidos, diferente de muitos países em que o evangelho é pregado de forma escondida e camuflada, e ai daqueles que forem encontrados prestando culto ao verdadeiro Deus!

Por tudo isso, urge a necessidade de fazermos a diferença e ser a geração que ama o Senhor não apenas com os lábios, não apenas de palavras, mas com atitudes, que servem não porque são apenas servos, mas filhos de Deus eleitos e adotados em Cristo Jesus, Senhor e Salvador nosso.

Se almejamos conhecer ao Senhor precisamos ouvir o Seu conselho que insistentemente declara: “Conheçamos, e prossigamos em conhecer ao Senhor...” (Oséias 6:3a). E como atravessar o véu rasgado que separava o homem de Deus senão por meio dos princípios espirituais que Ele mesmo estabeleceu, como a meditação na Sua Palavra (Bíblia), a oração, o jejum, a adoração, princípios esses que nos levam a um patamar mais alto, de modo que, quanto mais nos aproximamos de Deus mais reconhecemos o quão pecadores somos (agora, porém, lavados e remidos pelo sangue do Cordeiro), mais nos distanciamos do pecado e da corrupção deste mundo hostil e cruel, não porque nos foi imposto, mas porque escolhemos a agradar a um só Deus.

Certo é que o nosso presente e o nosso futuro pertencem ao Pai, e se deixarmos que as coisas desse mundo nos aflijam de tal modo que sejamos incapazes de buscar ao Senhor enquanto se pode achar (Isaías 55:6) jamais chegaremos a um nível mais profundo de intimidade com Ele. E se esse é o desejo do seu coração, siga o exemplo de Maria, escolha a boa parte, coloque Jesus como prioridade em sua vida e, por experiência própria posso afirmar que não apenas as demais coisas lhes serão acrescentadas como também se cumprirá em sua vida aquela a palavra de Paulo aos efésios:

Ora, àquele [Deus] que é poderoso para fazer tudo muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera (Efésios 3.20).

Com autoridade posso lhe assegurar que inúmeras são as lutas daqueles que escolheram colocar Jesus em primeiro lugar em suas vidas, incontáveis, porém, são as bênçãos e as vitórias que alcançamos por viver no centro da vontade de Deus. Diferentemente de Marta que se deixava sufocar pela ansiedade e aflições deste mundo, Maria compreendeu que o que Jesus tinha para oferecer dinheiro algum seria capaz de comprar, e aquela era a oportunidade da sua vida.

Não deixe que as tribulações, a ansiedade, as ambições e os cuidados dessa vida te sufoquem como sufocaram a Marta. Faça de Jesus o seu maior tesouro e escolha-O como a sua herança.


Escolha a boa parte... enquanto se pode achar!


Deus te abençoe!

Um comentário:

  1. Em meio a tantas palavras preciosas, fiquei sem palavras por tão rico conselho e não tão bela orientação. Parabéns,

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