Por muito tempo acreditava que os desertos em nossas vidas eram lugares de intimidade com Deus. Um lugar onde Deus se manifestava longe dos holofotes dos curiosos, expectadores e incrédulos. Um lugar onde poderíamos ter um momento único de intimidade com Ele. E eu não estava errado. Certamente Deus usa esses lugares ermos de nossa alma para revelar Seus pensamentos e propósitos em nossas vidas. Mas nem todo deserto é assim.
Ao longo da narrativa bíblica nos deparamos com desertos onde Deus não se manifestava, pelo contrário, onde o Senhor parecia propositadamente esconder Sua Face.
O Deserto de Jesus fora um momento consigo e com a voz do inimigo. Somente após a sua vitória no deserto é que os anjos vieram lhe servir e suprir as necessidades. Antes disso não.
Qual era, de fato, o propósito de Deus com Jesus no deserto naqueles 40 dias?
Primeiramente, precisamos compreender que o Deserto de Jesus não é um lugar de Depressão. Foi Deus quem o conduziu para lá.
“Então foi conduzido Jesus pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo.” Mateus 4:1
Existem Desertos que são fruto de um caminho errante, sem propósito e sem direção. São caminhos tortuosos em que nós decidimos andar independentes. Sua conseqüência é nos afastar da presença de Deus e nos conduzir à morte espiritual. Não que Deus não esteja lá também, pois não há lugar onde a presença de Deus não nos alcance (Salmos 139:7-11). Mas é um lugar onde rejeitamos a Sua Presença e a ignoramos completamente.
Há, outros, ainda, em que usamos como lugar de refúgio, guiados pelo medo e insegurança, desejosos apenas de ficar lá até morrer, até que tudo passe e o medo não mais exista. É um lugar de socorro, de fraqueza, onde somente o Pai pode nos encontrar e nos fazer sair. Este é o deserto de Elias.
Mas existe um terceiro lugar, um deserto que não escolhemos ir, que não é conseqüência de medo, fraqueza ou desvio. É um lugar onde somos conduzidos pelo próprio Deus. O deserto de Jesus.
Em segundo lugar, precisamos compreender que há um propósito explícito e implícito em Deus nos levar a este deserto. O objetivo mais visível está no versículo supracitado:
“[...] para ser tentado pelo diabo”.
Gostaria de conjecturar um pouco essa passagem de Cristo no deserto da tentação. Se você estivesse no lugar de Jesus e aparecesse o diabo, com todos os seus estereótipos conhecidos (com chifres e um tridente na mão, por exemplo), ou seja, de um modo inconfundível aos seus olhos, tendo a plena certeza de que aquele a falar com você seja o diabo, você resistiria à tentação como Jesus? Certamente que sim. Ninguém, em sã consciência, ao receber qualquer convite do diabo, sabendo que é o diabo, aceitaria. Não seria uma coisa tão difícil.
Portanto, acredito que talvez o diabo não tenha se materializado na frente de Jesus para tentá-lo, a exceção de uma ou outra situação. Seria muito fácil rejeitar suas provocações. Creio que na maioria das vezes o diabo o tentara da mesma forma que nos tenta até hoje: aquela voz em nossa consciência, personificada na figura do meu “eu lógico”, da minha razão, do meu instinto natural, que diz:
“Se eu sou filho de Deus então por que não poderia fazer isso?”;
“Afinal, eu mereço!”;
“Deus está comigo, então eu posso”;
“Se não for de Deus Ele vai me impedir”;
“Deus entende que sou fraco, Ele me perdoará”;
“Vou fazer isso pra Deus, então Ele vai abençoar”.
“Não tem problema uma vez, afinal, não posso parecer um fanático”.
Às vezes, ele (o tentador) se revela na voz de um amigo, de um conselheiro, de um companheiro, um familiar ou qualquer outra pessoa pela qual jamais creríamos pudesse ser a voz do inimigo por ela nos falando. No caso de Jesus, porém, creio que o campo de batalha (assim como os nossos desertos) se dera na própria mente, com raras exceções.
Mas, por que Deus levaria Jesus para ser tentado pelo diabo? Aqui se revela uma vontade implícita: pelo mesmo motivo que deixou a serpente tentar Eva, e Eva a Adão: conhecer o seu próprio coração. A diferença é que Jesus se submeteu a Deus até o fim, guardou as Suas Palavras no coração, sendo-lhe obediente até a morte.
E te lembrarás de todo o caminho, pelo qual o Senhor teu Deus te guiou no deserto estes quarenta anos, para te humilhar, e te provar, para saber o que estava no teu coração, se guardarias os seus mandamentos, ou não. (Deuteronômio 8:2)
O ministério de Jesus dependia das decisões que Ele tomaria no deserto da tentação. Da mesma forma, a Terra Prometida aos filhos de Israel dependia das decisões que eles tomassem no deserto.
O Deserto de Cristo é muito melhor do que a unção do Espírito Santo que opera milagres em nosso meio. Me refiro ao nosso crescimento. A unção nos capacita a tocar e transformar vidas para Cristo. O deserto, a sermos transformados. A unção e os milagres são para a Igreja, o povo escolhido por sua fé, para que creiam e se regozijem no Deus Todo-Poderoso. O deserto, porém, é tratamento, para que não sejamos reprovados, mesmo sendo usados por Deus através dos seus milagres e maravilhas que alcançam outras pessoas. Muitos clamam por unção e milagres. Mas a unção não transforma, ela edifica, mas não reconstrói. É a intimidade com Deus que muda o ser humano.
O Deserto de Cristo não é para termos um encontro com Deus. É um encontro com o nosso coração, conhecendo o seu oculto, onde habitam nossas fraquezas, as feridas que não deixamos serem curadas, as ministrações erradas que aprisiona nossa alma com religiosidade, ignorância, culpa, rancor, orgulho, inveja, cobiça e arrogância.
Moisés passou 40 anos em silêncio no deserto, antes de guiar o seu povo a Deus. Israel passou 40 anos no deserto para entrar na terra prometida (e poucos conseguiram). Jesus passou 40 dias no deserto para ser tentado. Deus silenciou-se por 400 anos até a vinda do Messias. Todos nós passamos por esses desertos, para sermos provados, para saber onde está o nosso coração, que coisas boas e ruins guardamos nele.
Parafraseando um querido pastor, relacionar-se com Deus não é sinônimo de servir a Deus, e talvez esse seja o erro mais comum em nosso meio: fazer muito, mas ser pouco. E por conta desse equívoco muitos acham que o muito fazer denota a muita intimidade ou aprovação do Pai. Até que estes se deparam com suas vidas completamente vazias, apesar de fazerem grandes obras em favor do Reino de Deus. A frustração é mera conseqüência. E aos que crêem que a maneira como são usados para alcançar outras pessoas e os dons recebidos são uma aprovação de Deus a respeito de suas próprias vidas, Cristo dirá veemente: - Nunca vos conheci! (Mateus 7:22-23).
O deserto de Cristo é um lugar de tratamento. Às vezes não conseguimos sair destes desertos, porque ficamos olhando para o céu, aguardando a manifestação da Glória de Deus a nos salvar, mas não olhamos para dentro de si, para onde Deus está apontando feridas e correntes que nos aprisionam e nos impedem de dar um passo a mais em direção a Ele. Muitos morrem vagando no deserto, mas alguns conseguem aprender a lição e saem vitoriosos para dar mais um passo. A estes o Senhor envia Seus anjos para lhes servir e os alimenta o suficiente para andarem até o próximo deserto onde lhes habilitará a dar mais um passo, com os pés firmes, a fé fortalecida e as feridas devidamente curadas.
Por isso, apesar da multidão de igrejas e de crentes ao redor do mundo todo, poucos são os que passam pela porta estreita, apertada e cheia de espinhos que conduz a vida eterna.
Que possamos aquietar nosso coração nestes desertos que vez ou outra o Espírito Santo nos leva, para aprendermos as lições necessárias ao nosso crescimento, conhecer o próprio coração e receber gratuitamente cura, libertação e salvação.
Viva o seu deserto como um lugar de amadurecimento necessário. Olhe ao seu redor e perceba que oportunidades Deus tem lhe dado para ministrar-lhe cura, perdão, arrependimento, reconciliação e fé. Certamente você sairá de lá apto a dar mais um passo no seu relacionamento com Ele. No Reino dos Céus, não importa o quanto você faz, mas quem você é Nele.
Deus te abençoe!
Leandro Dorneles
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